Objectivo deste blog


O blog "Portugal, um cais do mundo" pretende responder à pergunta "Que país queremos ser?".
Os autores propõem-se contribuir para esta questão por três vias:
- Aprofundar - Disc
utir modelos de optimização do papel de Portugal nas redes da globalização.
- Implementar - Propor formas de concretizar o sonho "Portugal, um cais do mundo".
- Divulgar - Tornar o sonho visível em Portugal e promover o reconhecimento internacional.


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Tenho um sonho! Portugal, um “cais do mundo” na rede da globalização (II)

Caros Amigos,

Neste primeiro dia do ano, decidi uma vez mais substituir o habitual postal de boas festas por um contributo para o desenvolvimento de Portugal. Na sequência do meu post de há 12 meses atrás (primeira mensagem deste blog), acredito numa mensagem positiva e na necessidade de visualização do “sucesso” como factor de motivação essencial para qualquer povo ou organização.

Tenho um sonho! Um dia Portugal será um “cais do mundo” na rede da globalização. Seremos um ponto de encontro de pessoas, ideias, bens e investimentos que passam pelo país, deixam a sua marca e partem para outros destinos. No mundo globalizado e em rede do século XXI, são os nós principais das redes que se constituem como elementos de maior valor e onde o nosso país se pode distinguir.

Geográfica, histórica e culturalmente, dispomos de condições particularmente atraentes para nos posicionarmos como um “cais do mundo”. O posicionamento geográfico de Portugal, no centro de quatro plataformas continentais, é uma clara vantagem competitiva como ponto de partidas e chegadas. Historicamente, aliás, sempre que nos virámos para fora, mantendo parte da criação de valor no país, conseguimos ter sucesso. Tal levou-nos ao longo dos séculos a moldar uma interculturalidade invejada e apreciada mundialmente.

Um dia Portugal será um “cais do mundo das pessoas”, atraindo outras nacionalidades para se fixarem temporariamente, capitalizando no talento português que saiu e promovendo o regresso de alguma da nossa diáspora. Uma política pública de “brain circulation”, em linha com as melhores práticas mundiais, centra-se assim em quatro segmentos: os portugueses que vivem no seu país, a diáspora, os estrangeiros que escolheram o nosso país e os potenciais que podem para cá vir. Por exemplo, no domínio do turismo da saúde, o nosso clima, hospitalidade e segurança colocam-nos numa posição invejável para atrair estrangeiros, nomeadamente europeus, para esta nova indústria.

Em parte, os Descobrimentos foram possíveis pela abertura multicultural de Portugal que absorveu as melhores ideias e tecnologia medieval de sábios judeus, muçulmanos e cristãos para um objectivo determinado. Um “cais do mundo das ideias” é uma consequência lógica da interacção de pessoas de origens variadas, mas tem de ser “alimentado” de oportunidades e pontos de encontro. O livro “Where Good Ideas Come From” de Steven Johnson demonstra-nos a importância de uma política pública de promoção de ambientes férteis à inovação e ao empreendedorismo, bem ilustrado em Israel e na sua “Start-up Nation”.

A circulação marítima e aérea de bens pelo mundo obedece a “hubs” condicionados pelo posicionamento geográfico. A localização invejável de Portugal proporciona um quase natural “cais do mundo dos bens”, particularmente como plataforma logística do que está em trânsito de / para África e América Latina. A geografia deve fazer parte do nosso modelo de desenvolvimento, nomeadamente na promoção da economia do mar, tirando partido da 11ª maior zona económica exclusiva marítima do mundo, a nossa. Os novos usos dos recursos do mar (por exemplo, nas novas indústrias “offshore”) devem começar já a ser promovidos activamente.

A crise essencialmente de confiança que alastra pela Europa e que corroí o empreendedorismo, a inovação e o crescimento só pode ser combatida com políticas de promoção de investimento mais agressivas e direccionadas. Portugal pode posicionar-se com um “cais do mundo do investimento”, tanto aproveitando o potencial do capital asiático e de países emergentes, como desenhando incentivos à localização de centros de nearshore ou captando PMEs inovadoras do norte da Europa. Neste sentido, Singapura tem sido ao longo de décadas um exemplo paradigmático de atracção concertada de Investimento Directo Estrangeiro, em sintonia com uma eficaz política de “brain circulation”.

Neste primeiro dia do ano, tenho um sonho: Portugal será um “cais do mundo” na rede da globalização. A nossa geração poderá então legar aos nossos filhos um país mais próspero, mas sobretudo mais feliz.

Feliz 2013!

Como alavancar na diáspora a promoção de melhores relações económicas e culturais no contexto internacional e um regresso sustentado do talento e do saber?

Tradicionalmente, a discussão de políticas públicas sobre os portugueses no estrangeiro tem-se concentrado nos serviços consulares, transferências de emigrantes e processos eleitorais – isto é, numa perspectiva burocrática. Esta é uma visão demasiado redutora do papel da diáspora que não tem em conta o potencial de promoção de melhores relações económicas e culturais no contexto internacional. É desde logo um mau sinal ter havido até hoje um esforço limitado para saber como este capital humano pode ser identificado, cultivado e mobilizado. A solução passa por desenvolver e implementar uma estratégia concertada de alavancar desenvolvimento por via da diáspora.
Desenvolver um modelo eficaz de mobilização da diáspora
Devido à globalização, a maior parte dos países que tentaram parar a “fuga de cérebros” (“brain drain”), ou promover o regresso do talento da diáspora, acabaram por falhar. Em alternativa, nos últimos anos temos assistido a tentativas de sucesso de promover a “circulação de cérebros” (“brain circulation”), onde o desenvolvimento é acelerado pelo encorajamento da participação da diáspora no desenvolvimento do país de origem, pela transferência de conhecimento e competências, em complemento à atracção – mesmo que temporária – de talento estrangeiro. Portugal não deve olhar para os emigrantes como recursos perdidos, já que podem ser capitalizados para o desenvolvimento económico e social. As formas de alavancar na diáspora nacional passam por olhar para as competências técnicas e de negócio, relacionamentos comerciais, financiamento, trocas comerciais e na área de educação, etc.
Internacionalmente, há vários modelos de mobilização da diáspora que importa analisar face ao contexto português. A Escócia e a Índia alavancam nos executivos da sua diáspora em grandes multinacionais para influenciar decisões de localização e incentivar “Redes de Outsourcing de Tecnologia e I&D”. A diáspora da África do Sul e de Israel ajuda no desenvolvimento e financiamento de projectos de start-ups nos respectivos países, via “Redes de Venture Capital”. A China é conhecida por capitalizar na sua Bamboo Network, onde os membros da diáspora funcionam como investidores, já que os custos de transacção são reduzidos pela confiança entre os participantes da sua “Rede de Investidores”. Os membros da diáspora da Arménia e da Índia ajudam a identificar nichos, traduzindo oportunidades globais em projectos de negócio, numa verdadeira “Rede de Prospecção”. A China e a Coreia apostam no retorno do respectivo talento na diáspora, através de incentivos (fiscais, parques tecnológicos, etc), criando “Redes de Circulação do Saber”. A diáspora de sucesso da Arménia envia de volta ao país contratos de outsourcing, criando assim “Redes de Outsourcing”. Qual o modelo que mais se adequa ao nosso país? Uma resposta adequada implica uma análise profunda que importa efectuar com urgência.
Outros países já promoveram reflexões sobre a diáspora que podem servir como inspiração. Por exemplo, em 2000 / 2001, o Governo Indiano desenvolveu um estudo aprofundado sobre como capitalizar na sua diáspora de cerca de 20 milhões de membros. Uma agenda de reformas e iniciativas foi produzida, incluindo a criação de um novo Ministério dedicado à diáspora e a maximizar os seus efeitos económicos, culturais e sociais no próprio país. Desde então, foram criadas redes de membros da diáspora nos negócios, ciência, cultura e educação, desenvolvidas estratégias para os jovens indianos a viver no estrangeiro, criadas várias ocasiões e sistemas de contacto entre a Índia e a sua diáspora, etc.
Identificar e mobilizar os “campeões da diáspora”
Para capitalizar bem na diáspora, há que apostar em “campeões individuais”. Trata-se sobretudo de portugueses de sucesso no estrangeiro, overachievers, capazes de transformar ideias em projectos tangíveis que sirvam de exemplo – efeito de demonstração.
Paradoxalmente, para depois capitalizar sustentadamente nestes exemplos, há que ter uma organização capaz em Portugal para servir como integradora da rede e ajudar na concretização e marketing destes projectos e dos seus resultados tangíveis. O Governo deve ter aqui um papel de suporte, mas nunca ambicionar ser o “condutor” do processo.
Promover plataformas em rede para conectar a diáspora
Portugal necessita desenvolver planos metódicos para capitalizar nos mais de quatro milhões de portugueses que vivem fora do país, tal como as boas universidades internacionais fazem com a sua rede de antigos alunos, tornando-os nos seus melhores embaixadores, financiadores (directos ou indirectos), “olheiros” de talento, garantes de benchmarking contínuo, etc. Desde logo, há que criar ou potenciar redes de emigrantes. As mais produtivas vão bem para além de trocas sociais ou culturais e centram-se num determinado domínio profissional – redes de médicos, engenheiros, investigadores, empreendedores, etc. Deste modo, os seus membros têm mais em comum e tendem a fazer mais e melhores investimentos conjuntos. Estas redes de profissionais da diáspora também facilitam os contactos vindos dos decisores do próprio país, já que são naturalmente mais focados.
A construção, promoção e desenvolvimento de infra-estruturas de comunicação para “re-conectar” com o talento perdido no estrangeiro é outra das necessidades do nosso país. A Internet oferece hoje uma forma de ligar líderes e talento no próprio país e na diáspora de forma instantânea. Uma base de dados actualizada de profissionais na diáspora permite às empresas nacionais apelar a talento escondido, novos emigrantes encontrarem redes de apoio no exterior e emigrantes de sucesso responderem às solicitações de negócio em Portugal. Outra possibilidade de alavancar na Internet é dada pela Thailand Reverse Brain Drain Project, oferecendo à diáspora informação detalhada sobre incentivos ao investimento, actualizações regulatórias, oferta de parcerias de negócio internacional, oportunidades de investimento, etc.
Alavancar na diáspora como catalisador da mudança interna
Portugal não pode ter receio de alavancar nos portugueses colocados em cargos influentes tanto em instituições como em grandes empresas internacionais. O mérito de chegar a estes cargos deve ser individual, mas mesmo grandes países (como o Reino Unido) tem um departamento cujo único objectivo é “facilitar” estas colocações internacionais, obviamente na perspectiva de retorno posterior desse investimento em influência política, mas sobretudo económica.
O Erasmus e o Programa Contacto devem ser vistos como elementos estruturantes do desenvolvimento nacional, como catalisadores da mudança e da indução das melhores práticas internacionais. O número de jovens a passar por estes programas deve ser incrementado, mas incluindo uma componente de retorno de investimento e de ligação à diáspora nacional. Para além dos jovens, também os profissionais de áreas estratégicas devem ser incentivados a “rodar” por empresas fora do país. Esta diáspora temporária e altamente qualificada virá com a visão “corrosiva” determinante para algumas das mudanças estruturantes – mais risco, mais empreendedorismo, mais visão global.
Uma estratégia para alavancar no talento e recursos espalhados pela diáspora definitivamente não é um substituto para as reformas económicas estruturais que são necessárias para atacar as causas de alguma “fuga de cérebros” – promover a concorrência, encorajar o empreendedorismo, aumentar o investimento produtivo, aligeirar os requisitos burocráticos, melhorar a educação, resolver a morosidade da justiça, etc. No entanto, uma estratégia que – para além destes pontos – encoraje a participação activa dos nossos emigrantes no desenvolvimento do seu país de origem, pode ter um papel catalisador de referência.

Nota: Este texto foi originalmente publicado em Abril de 2009 pelo IPSD

Paulo Simões